Há muita gente que acredita que o controle de preços é uma boa tática que um governo tem para “ajudar” um mercado a funcionar, proporcionando produtos importantes a preços inferiores ao que teriam se fossem deixados livres. Uma das melhores respostas dadas a essa questão está na obra “As Seis Lições“, de Ludwig Von Mises, no capítulo (ou lição) “O Intervencionismo”:
“O governo ouve as queixas do povo de que o preço do leite subiu. E o leite é, sem dúvida, muito importante, sobretudo para a geração em crescimento, para as crianças. Por conseguinte, estabelece um preço máximo para esse produto, preço máximo que é inferior ao que seria o preço potencial de mercado. Então o governo diz: “Estamos certos de que fizemos tudo o que era preciso para permitir aos pobres a compra de todo o leite de que necessitam para alimentar os filhos”.
Mas que acontece? Por um lado, o menor preço do leite provoca o aumento da demanda do produto; pessoas que não tinham meios de comprá-lo a um preço mais alto, podem agora fazê-lo ao preço reduzido por decreto oficial. Por outro lado, parte dos produtores de leite, aqueles que estão produzindo a custos mais elevados – isto é, os produtores marginais – começam a sofrer prejuízos, visto que o preço decretado pelo governo é inferior aos custos do produto.
Este é o ponto crucial na economia de mercado. O empresário privado, o produtor privado, não pode sofrer prejuízo no cômputo final de suas atividades.
E como não pode ter prejuízos com o leite, restringe a venda deste produto para o mercado. Pode vender algumas de suas vacas para o matadouro; pode também, em vez de leite, fabricar e vender derivados do produto, como coalhada, manteiga ou queijo.
A interferência do governo no preço do leite redunda, pois, em menor quantidade do produto do que a que havia antes, redução que é concomitante a são obrigadas a esperar do lado de fora.
As longas filas diante das lojas parecem sempre um fenômeno corriqueiro numa cidade em que o governo tenha decretado preços máximos para as mercadorias que lhe pareciam importantes. Foi o que se passou em todos os lugares onde o preço do leite foi controlado. Por outro lado, isso foi sempre prognosticado pelos economistas – obviamente apenas pelos economistas sensatos, que, aliás, não são muito numerosos.
Mas qual é a consequência do controle governamental de preços? O governo se frustra. Pretendia aumentar a satisfação dos consumidores de leite, mas na verdade, descontentou-os.
Antes de sua interferência, o leite era caro, mas era possível comprá-lo. Agora a quantidade disponível é insuficiente. Com isso, o consumo total se reduz. As crianças passam a tomar menos leite, e chegam a não mais tomá-lo. A medida a que o governo recorre em seguida é o racionamento.
Mas racionamento significa tão-somente que algumas pessoas são privilegiadas e conseguem obter leite, enquanto outras ficam sem nenhum. Quem obtém e quem não obtém é obviamente algo sempre determinado de forma muito arbitrária. Pode ser estipulado, por exemplo, que crianças com menos de quatro anos de idade devem tomar leite, e aquelas com mais de quatro, ou entre quatro e seis, devem receber apenas a metade da ração a que as menores fazem jus.
Faça o governo o que fizer, permanece o fato de que só há disponível uma menor quantidade de leite. Consequentemente, a população está ainda mais insatisfeita que antes. O governo pergunta, então, aos produtores de leite (porque não tem imaginação suficiente para descobrir por si mesmo): “Por que não produzem a mesma quantidade que antes?”. Obtém a resposta: “É impossível, uma vez que os custos de produção são superiores ao preço máximo fixado pelo governo”.
As autoridades se põem em seguida a estudar os custos dos vários fatores de produção, vindo a descobrir que um deles é a forragem. “Pois bem”, diz o governo, “o mesmo controle que impusemos ao leite, vamos aplicar agora à forragem. Determinaremos um preço máximo para ela e os produtores de leite poderão alimentar seu gado a preços mais baixos, com menor dispêndio. Com isto, tudo se resolverá: os produtores de leite terão condições de produzir em maior quantidade e venderão mais.”
Que acontece nesse caso? Repete-se, com a forragem, a mesma história acontecida com o leite, e, como é fácil depreender, pelas mesmíssimas razões. A produção de forragem diminui e as autoridades se veem novamente diante de um dilema. Nessas circunstâncias, providenciam novos interlocutores, no intuito de descobrir o que há de errado com a produção de forragem. E recebem dos produtores de forragem uma explicação idêntica à que lhes fora fornecida pelos produtores de leite. De sorte que o governo é compelido a dar um outro passo, já que não quer abrir mão do princípio do controle de preços. Determina preços máximos para os bens de produção necessários à produção de forragem.
E a mesma história, mais uma vez, se desenrola. Assim, o governo começa a controlar não mais apenas o leite, mas também os ovos, a carne e outros artigos essenciais. E todas as vezes alcança o mesmo resultado, por toda parte a de produção, e a limitar os preços dos bens de produção necessários à elaboração daqueles bens de consumo com preços tabelados.
E assim o governo, que começara com o controle de alguns poucos fatores, recua cada vez mais em direção à base do processo produtivo, fixando preços máximos para todas as modalidades de bens de produção, incluindo-se ai, evidentemente, o preço da mão-de-obra, pois, sem controle salarial, o “controle de custos” efetuado pelo governo seria um contra-senso.
Ademais, o governo não tem como limitar sua interferência no mercado apenas ao que se lhe afigura como bem de primeira necessidade: leite, manteiga, ovos e carne. Precisa necessariamente incluir os bens de luxo, porquanto, se não limitasse seus preços, o capital e a mão-de-obra abandonariam a produção dos artigos de primeira necessidade e acorreriam à produção dessas mercadorias que o governo reputa supérfluas.
Portanto, a interferência isolada no preço de um ou outro bem de consumo sempre gera efeitos – e é fundamental compreendê-lo – ainda menos satisfatórios que as condições que prevaleciam anteriormente: antes da interferência, o leite e os ovos são caros; depois, começam a sumir do mercado.
O governo considerava esses artigos tão importantes que interferiu; queria torná-los mais abundantes, ampliar sua oferta. O resultado foi o contrário: a interferência isolada deu origem a uma situação que – do ponto de vista do governo – é ainda mais indesejável que a anterior, que se pretendia alterar.
E o governo acabará por chegar a um ponto em que todos os preços, padrões salariais, taxas de juro, em suma, tudo o que compõe o conjunto do sistema econômico, é determinado por ele. E isso, obviamente, é socialismo.”
0 comentário